Nesta pista, alguns moradores da região descreverão a você como era a rotina das famílias no período da colonização, quais eram as conquistas e diversões e as dificuldades e desafios cotidianos de uma época em que ainda não havia muita infraestrutura. Lembre-se, os depoimentos a seguir te ajudarão na escrita do seu diário. Leia com atenção e imagine-se neste período...
"Meus pais eram lavradores. Vieram de tropa, em carros de duas juntas de bois, da região de Pirajú (SP) até Campos do Mourão, lá pelo ano de 1910. Depois de meses chegaram ao destino final. Lá no Sertãozinho nós morava num ranchinho de pau, coberto de folhas. Sem nenhum conforto. Dormia numa tarimba (cama feita de paus finos, suspensos por forquilhas de árvores). O fogão era um oco (buraco) no chão. Eu cozinhava em cima dos tição e das brasas. Equilibrava panelas pra não entornar (virar) o caldo e as comidas. Desde os dez... doze anos eu fazia trabalho de homem. Tocava carroça e montava a cavalo. Apartava e reunia o gado. Tirava o leite das vacas. Tratava dos animais. A gente tinha lavoura, muita cana, cafezal, milho e horta grande. Até carneiros e porcada de engorda. Aqui no centro, em 1930, tinha só três casas (ranchões) na beira da estradinha e mais nada. Eu casei em 10 de fevereiro de 1934, teve duas festas nesse dia. Baile numa sala e fandango na outra. Papai reuniu os cantadores e violeiros que ele mais gostava, daqueles violeiros que quando ponteava (dedilhava) as cordas e cantava, a mulherada até chorava. As mercadorias pra vender daqui (Campo Mourão) pra lá em Guarapuava iam tudo de cargueiro em tropas de dez... vinte... trinta mulas. Junto iam alguns donos das mercadorias, que levavam pra vender e comprar o que fosse preciso e pedido pelos vizinhos. Com tempo bom a caravana ia e vinha em um mês. Quando chovia demorava quase sessenta dias e o ‘necessário’ faltava. Muitos parentes e conhecidos meus morreram de picadas de cobras. Outro perigo eram as onças, que atacam por trás. Elas têm medo da gente mas não perdoam os animais de criação. Mas, os bichinhos que mais matavam pessoas eram os mosquitos da maleita (malária). Não tinha farmácia e nem médico, se curava com ervas, paus e cascas do mato. Como não tinha médico, quem curava eram os benzedores e curadores, com rezas e remédios que só eles sabiam fazer".
Fonte: BATHKE JÜNIOR, Wille. Deolinda Luiza Pereira, 20. Tribuna do Interior, Campo Mourão, 13 de jan. de 2002. p. 7. Especial: Projeto Raízes.
“Nasci ali, na beira do Rio do Campo, no dia 05 de março de 1916. Meus pais eram paulistas. Casaram, tiveram 18 filhos e 16 se criaram. Destes, quatro nasceram em Campo Mourão. Aqui meu pai requereu muita terra devoluta do Estado, ali por perto do Rio do Campo. Fez uma casa de pinho lascado, pra cá do rio. Tudo era produzido aqui e tirado da terra muito boa de plantar. De fora só comprava sal, farinha de trigo, tecidos, calçados, munição pra caçar e o arriame de montar (a cavalo) e puxar carroça. Os carros de boi, as cangas, as carroças... se fazia aqui mesmo. Tudo de pau e ferragem forjada no fogo e moldada com marreta na bigorna. Sempre aparecia um ferreiro... um carpinteiro bom, no meio dos homens. Tinha gente de todo ofício. Lá no Lajeado (Mamborê) comprei 82 alqueires de terra legalizada. Fiz uma casa boa de tábuas e tabuinhas, abri várias roças e criava porco. Lá no Mamborê matei muito tateto (porco do mato), veado e onça. O tateto era perigoso. Eles andavam em vara (bando) e quando se sentiam acuados, formavam uma roda em volta do cachorro ou da gente e se não subisse num pau ou fugisse, eles matavam”.
Fonte: BATHKE JÜNIOR, Wille. Quirino Dornelles Barboza, 21. Tribuna do Interior, Campo Mourão, 20 de jan. de 2002. p. 7. Especial: Projeto Raízes.
“Quando comecei a entender as coisas, não existia mais que umas dez ou quinze famílias em toda a região. Onde está a cidade era só campo e umas árvores diferentes, espalhadas. Tinha muitas aves, animais, amoras, flores, e frutinha nativas. O que não se via mesmo, nestes campos, era gente!”, sorri dona Laura. “Eu me pelava de medo dos bugres (índios). Eles chegavam nas taperas (ranchos) e não pediam. Pegava e levavam. Não falavam nada. Só se comunicavam por sinais”.
1930 – “Quando eu era menina e vinha ali pelo centro da cidade, que hoje é Campo Mourão, era só de cavalo ou na carroça. Não tinha nada. Nunca imaginei que tudo aquilo ia virar uma cidade grande e bonita. Na beira da estradinha que vinha da fazenda só se via uma ou outra casinha de madeira... de lascas de palmito, cobertas de taboinhas de pinheiro ou de folhas de palmeiras, sem nenhum conforto. Nada de assoalho ou de forro. As janelas e as portas eram de pau cortado do mato... tudo aberto, cheio de frestas. As poucas famílias moravam longe uma da outra. A gente só se via em festas ou quando o padre vinha”.
Fonte: BATHKE JÜNIOR, Wille. Guilherme de Paula Xavier, 37. Tribuna do Interior, Campo Mourão, 12 de mai. de 2002. p. 2c. Especial: Projeto Raízes.
Em 1909, a família Custodio de Oliveira chegou aos Campos do Mourão. No início trabalharam para José Luiz Pereira. Depois tomaram posse de pequenas áreas e derrubaram a mata. Plantavam café, criavam porcos e faziam roça de arroz, feijão, milho, mandioca e tudo que precisavam para alimentar as poucas pessoas que moravam espalhadas pela região de Campo Mourão.
“Meu avô, pai e tios, pelo que falavam, imaginavam isso aqui uma pastagem enorme e boa para criar gado. Partiram por estradinhas do interior de São Paulo e caminhos dentro do Paraná, no lombo de animais, cavalos, mulas de cargas e carros-de-boi. Peregrinaram quase um ano, com mulheres e crianças. Acampavam, comiam e dormiam onde anoitecia e no clarear do dia, já estavam no trecho. Minha mãe contava detalhes de Pitanga e de Campo Mourão. Conheceu o índio Bandeira, chamado de capitão, que quer dizer chefe dos bugres (índio) que acampavam no Campo Bandeira. Ela conheceu o chefe dos índios em Pitanga, antes de chegar em Campo Mourão. Lá existia muito bugre. Depois sumiram lá pras bandas de Laranjeiras do Sul por causa da invasão dos brancos que foram tomando conta da terra deles. Deu muita briga e mataram muitos bugres. Eu nasci no dia 20 de janeiro de 1915, na Campina dos Teodoro, num casebre de pau-a-pique e chão de terra socada, na cabeceira do Rio Pingo d’Água”, destaca Sebastião Custodio de Oliveira. “A primeira capelinha foi de pau e sapé, por ali no Jardim Santa Cruz, onde tem uma gruta de pedra. Tinha um cruzeiro grande de cedro verde. Cabia só umas cinco pessoas. De vez em quando, se passavam anos, aparecia um padre por ali e rezava uma missa. Fazia batizados e casamentos, tudo de uma vez. Não tinha nem parede dos lados do rancho da capela. Quem tinha recebido uma graça e cura, aproveitava pra pagar as promessa à Santa Cruz. Os padres vinham de tempos em tempos de Guarapuava. Paravam nos ranchos, muito distantes uns dos outros, pelas beiras das picadas”.
“Os ranchos que a gente morava no começo, eram feitos de troncos de palmito partidos no meio, de paus cortados no mato, amarrados com cipó e cobertos com folhas de palmito. O chão era de terra. O fogão a gente fazia de barro, um buraco no meio e uma chapa de ferro em cima. As panelas eram de ferro preto. As camas, as gamelas, cadeiras, mesa e as prateleiras, eram tudo de pau”, descreve Eugenio Custodio de Oliveira, nascido em 27 de dezembro de 1923.
Fonte: BATHKE JÜNIOR, Wille. Família Custodio de Oliveira, 47. Tribuna do Interior, Campo Mourão, 21 de jul. de 2002. p. 2c. Especial: Projeto Raízes.